“Charlie bit my finger” ou o Charlie mordeu-me o dedo, foi um dos primeiros vídeos virais, chegando a ser visualizado 880 milhões de vezes.
Este vídeo familiar de 2007, mostra um irmão bebé (Charlie, de um ano), ao colo de outro mais velho (Harry, de três anos). Harry coloca insistentemente o dedo na boca de Charlie para logo a seguir se afligir por ele o ter mordido. Esta cena familiar foi captada por uma câmara doméstica, e o vídeo disponibilizado online através da plataforma de Youtube por ser “muito pesado para ser enviado por email para o avô que vivia longe dos netos”. Eis se não quando, e inesperadamente, milhares de famílias o viram e comentaram, tornando-se o nº 1 do Top50 dos vídeos mais vistos de sempre no Youtube.
No passado domingo, e pela módica quantia de 761 milhares de dólares, 55 segundos da história da internet foram adquiridos por um comprador anónimo e, por isso, apagados para sempre do Youtube depois de por ali navegarem durante 15 anos. Deixou assim este vídeo de estar acessível, passando a ser considerado, por alguns, como uma obra de arte digital, com o respetivo valor monetário atribuído pelo mercado, e com este novo estatuto, a ser visto por poucos e em exclusividade.
Esta é uma história possível para um objeto que inadvertidamente se tornou precioso.
Outra história é a que acontece no próximo sábado, dia 29 de maio, no nosso palco do Teatro Viriato. Às 21h estreamos a versão portuguesa do “The show must go on”, peça icónica de Jérôme Bel, um dos mais rebeldes e astutos artistas do século XX e XXI, conhecido por aliar humor e conceptualização nas suas obras.
O coreógrafo francês, que se recusa atualmente a viajar de avião por causa das alterações climáticas, aceitou esta proposta para celebrar os vinte anos desta obra itinerando-a por Portugal, em Viseu, Lisboa e Porto, com um elenco inteiramente residente em Portugal. No próximo sábado poderemos assistir a esta peça que mudou a história da dança pela módica quantia de um bilhete de teatro. Uma peça que percorreu o mundo e que, esperemos, sobreviverá às restrições da geografia e do tempo para poder continuar a fascinar espectadores por todo o lado e por muito tempo.
Se me dessem a escolher entre a arte que se renova e se replica, mantendo-se singular em cada apresentação, e aquela que se vende por um milhão mas que se torna inacessível aos demais, eu não hesitaria. Ter a oportunidade de ver esta peça na nossa cidade é um luxo que não é avaliável nem em dinheiro nem em crachás para o nosso currículo (e muito menos numa coleção de arte privada). Basta-nos agradecer com a nossa presença e o nosso aplauso.
Apareçam! É garantido o fascínio e o prazer de poder assistir ao vivo a uma obra de arte!
____
Patrícia Portela, diretora artística do Teatro Viriato